Viana do Castelo: água ou caminho?

Continuando com o bloco de cidades da Portugaliza, nesta ocasião vamos centrar-nos em Viana do Castelo, cuja etimologia oferece certa controvérsia. Vianas, mesmo que nesta ocasião se fale especialmente de Viana do Castelo (antiga Viana da Foz do Lima), há várias: além da referida, em Portugal está também Viana do Alentejo (antiga Viana a par de Alvito), e na Galiza ficam Viana da Grade e S. Pedro de Viana e Sta. Cruz de Viana (as três no conc. Chantada) e Viana do Bolo, e há também um Vião (graf. isol. Vián) e um Ouvianha. E não só: o topónimo repete-se noutras áreas da península ibérica e mesmo de Europa, como se verá.

Viana do Castelo, ao fundo, com a igreja da Santa Luzia no primeiro plano

A controvérsia ibérica/céltica/latina

Para a explicação etimológica há várias possibilidades. Em primeiro lugar, há quem defenda que Viana provém do ibérico *viana, com o significado de “monte” (Dic. Porto Editora). Na mesma linha, mas com origem diferente, há a hipótese trazida através da Vindabona romana (Viena, Áustria), que recolheria um topónimo céltico com base na palavra beann (monte, colina ou pico), com a variante benn em irlandês protogaélico, muito mais próximo ao celta primitivo, e com o mesmo significado. A hipótese do orónimo ganha força se consideradas as ocorrências de Viana na Galiza (Viana do Bolo) e na Espanha (Viana de Mondéjar, Viana de Jadreque e Viana de Duero), mas pode ser perfeitamente descartável atendendo à perfeita planície alentejana de Viana do Alentejo, por exemplo.

Mas as possibilidades e a controvérsia entre ibérico e céltico não rematam aí. Sem passar polas etimologias populares que relacionam Viana com as vides e o vinho, e que carecem de fundamento, houve quem, como Julio Caro Baroja, desse uma hipótese totalmente diferente, neste caso para a vila de Viana (Navarra), relacionando a terminação -ana com as villae romanas. O própio Caro Baroja desistiu desta opção ao comprovar que o caso que estudava se tratava de uma fundação do s. XIII que, por isso mesmo, se afastava definitivamente do mundo romano. É então quando propõe a hipótese de que Viana referencie apenas um lugar pelo que passa uma via ou caminho, com independência da sua orografia e da proximidade de vilas romanas. Seria a via, nomeada em latim, o que lhe daria significação ao lugar. E neste ponto coincide com outro estudioso da toponímia galego-portuguesa como José da Cunha, que defende essa mesma posição para Viana do Castelo e as outras ocorrências do topónimo. Porém, se comparada a localização, por exemplo, de Viana do Castelo e de Viana do Bolo com as principais vias romanas, observar-se-á como ficam claramente à margem.

Por outro caminho totalmente diferente caminha a explicação de Juan Cruz Labeaga e Jürgen Untermann, que explicam a Viana navarra mediante uma tésela céltica aparecida no jazigo arqueológico de La Custodia, onde aparece a inscrição ueniakum, traduzível por “os de Uenia”. De modo que Venia seria Viana, ainda que, como eles próprios reconheceram, a evolução fonética de uma forma para outra encontra serias dificuldades. E, por outra parte, haveria que desmascarar o significado de Venia.

A controvérsia basca/latina

Outra possibilidade, totalmente diferente, é a apontada por  Juan Antonio Frago García: Viana procederia de bi anai, isto é, “dois irmãos” em língua basca. Um significado assim não seria assim tão estranho se considerada outra ocorrência similar na península ibérica: Dos Hermanas (Sevilha), que, porém, tem documentado o seu topónimo e a sua explicação desde 1404. De ideia similar são outros autores, como Gonzalo Navaza Blanco, que relaciona vi- com o latim (e não com o éuskera) bi (“dous”), mas -ana com –amna, isto é, corrente de água, e não com o anai basco. Na Galiza e em Portugal estão sobradamente documentados topónimos com amnium, que habitualmente deu formas como ambos e ambas, depois amiúde confundidas com o pronome numeral (v. Ambaságuas, Ambasmestas, Entrambaságuas, Entrambosrios, etc. — Sobre o tema céltico ambas, veja-se a nota publicada neste caderno), mas que também pode dar terminações -ana e -ama. Para Navaza esta seria a explicação de todas as Vianas peninsulares. Desse modo, Viana seria, na realidade, Biana, e significaria, lugar com dous rios, ou entre dous rios.

Seja lá como for, parece que para as Vianas ocidentais, isto é, as galego-portuguesas, a explicação mais plausível seja a proposta por Navaza: Viana seria uma vila próxima a dois rios. No caso de Viana do Bolo, a presença dos dois rios está clara: o rio Camba aflui ao rio Bibei justo diante da vila; e no caso de Viana do Castelo é evidente, já polo seu nome anterior, Viana da Foz do Lima, a existência de um desses dois rios, mas qual seria o outro?

8 respostas

  1. Viana do Alentejo bem poderia ser um topónimo de repovoação, vindo do norte, de maneira que Viana pode igualmente significar "monte", ainda que no Alentejo o que haja é uma grande planície.

  2. O que nom entendo é como se pode defender um étimo *bi amnia para os Viana do ámbito castelhanófono, pois nessa área a sequência consonántica -mn- teria de dar, atendendo às mais elementares pautas de fonética histórica, umha consoante nasal palatal grafada em espanhol.
    Saúdos e parabéns polo projeto. Quanto mais afondo nele, mais gosto.

  3. Desde mi ignorancia en estas cosas lo único que os puedo decir fruto de mis estudios sobre las vías romanas es lo siguiente. Esa Vías, Viascom, Vianas me las encuentro pegadas a las trazas viarias romanas, concretamente la Viana do Castelo, la antiquísima Atrium de los escritos medievales, se encuentra formando parte de la vía romana conocida como "per loca maritima" que como su nombre indica iba por la costa, por el litoral costero. Es un topónimo viario muy significativo, a mi entender. Fijaros en este otro topónimo caminero que encontramos también en el Itinerario de Antonino con el nombre de Camino, Sucamino…, exáctamente igual al topónimo que nos encontramos a poca distancia y siguiendo la línea costera de la mencionada vía antoniniana: Caminha = Camiña < Caminia < Camina = Camino. Son ambas poblaciones esas mansiones olvidadas, por sus distancias, de esa vieja ruta romana. Topónimos viarios romanos como lo pueden ser: estrada, calzada, rua….las mismas "Beades" o VIAdes (doc. medievales y en la actual portugal), las Sobreiras (no Sobreiros) siempre al pie de los viejos caminos, posiblemente de un sovereda (so=al lado,…de una vereda o camino para los veredarius).

    Desconocia que Caro Baroja y José da Cunha ya se habían pronunciado en esto que comento de las Vianas y es una satisfación para mi que nada tengo que ver con esto de la lingüística y estudio de las palabras.

    Un saludo y disculpar esta intromisión.

    Raúl Villanueva González.

  4. A origem do nome Viana, sempre me interessou, até porque e indo ao encontro do estudo acima espectacularmente bem desenvolvido, não se encontra uma lógica direta na toponímia Viana; parece como que saída do nada. Aliás, no caso de Viana do Castelo, a fundação da vila pelo Rei D. Afonso III através de carta de foral em 1258, não parece ter muita lógica, porque a existir alguma povoação, não teria a mesma relevância das povoações ao seu redor, como Castelo do Neiva a Sul, ou Areosa a Norte. Esta última pode até estar na origem da toponímia de Viana, na medida em que, esta freguesia antes de possuir o nome Areosa, tinha a designação no tempo dos rmanos de Ovinea que derivou em Vinea e em Senhora da Vinha já no tempo da reconquista cristã. A verdade é que Areosa não é, nem nunca teve vinhas nem produção de Vinho, o que demonstra que a toponímia Vinea foi transposta para uma designação religiosa que foneticamente fizesse sentido –> vinha. Ora "vinea" é uam designação potencial para uma derivação para Viana, até porque o Castro Celta sobranceiro à atual cidade fica localizado na freguesia de Areosa. Também á estudos que apontam para a toponimia Viana derivar do saxão com significado de caminho, com localidades no centro da Europa como Vien, Vienn, ou Viena.

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